"João amava
Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que
amava Joaquim que amava Lili
que não amava
ninguém.
João foi para os
Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de
desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se
e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha
entrado na história"
(Carlos Drummond)
João
amava Teresa, era dela seus sonhos mais bonitos e ilusões mais doces. Era ela o
destino de suas preces, o encontro de seus desejos, a personificação daquele
tipo de amor que ele só havia ouvido falar. Mas Teresa, bem, Teresa achava
estar em Raimundo, que nunca a olhou com devoção, a paz que tanto precisava.
Queria que Raimundo e sua inconstância fossem a razão das suas noites de sono
desperdiçadas, que fosse dele a voz do "bom dia" de todas as manhãs
chuvosas e que seu peito batesse mais rápido no canto do pescoço dele. Mas
Raimundo queria o colo quente de Maria, queria que sua inconstância sossegasse
ali, e não causasse insônia em ninguém; queria esquecer sua vida de
inconstância e aventura, a vida que fizera Teresa se apaixonar, e encontrar a
calmaria de navegar ao lado de uma pessoa só por todos os mares e abraços.
Teresa amava a parte de Raimundo que ele não suportava mais, Maria não amava
Raimundo, nem sua inconstância nem sua vida em montanha-russa; Maria sonhava em
ser a inspiração das rimas pobres de Joaquim, queria a simplicidade de seus
acordes e o silêncio daqueles olhares que diziam tanto. Maria queria ser a musa
de todas aquelas canções, ser a moça que fizera aquele coração cantar, ser do
tamanho exato do sonho daquele rapaz de coração simples, voz bonita e rimas
pobres. Mas aquele rapaz, tão simples, só e dependente, queria a independência
de Lili. Joaquim amava o vento de liberdade que passava por ele sempre que Lili
se aproximava; amava seus cabelos curtos mal penteados; sua bagunça interna
revelada também no seu jeito externo, naquelas unhas roídas, no jeans
desbotado, no seu tênis rabiscado. Joaquim queria a descrença de Lili no amor,
sua independência, sua felicidade em estar só - e sã. Mas, só e sã, Lili
não amava ninguém.
E porque o amor tem
dessas coisas, porque talvez o que a gente procure não seja bem o que a gente
precisa e porque a gente nem sempre sabe do que realmente precisa, essa
quadrilha não se resolveu. Porque quando amamos alguém transformamos todo o
resto do mundo em preto e branco e porque nenhum deles foi capaz de olhar para
o outro lado da rua e de colorir e descobrir o olhar que era dedicado em
segredo, a quadrilha terminou em solidão. Porque chances não foram dadas, porque
oportunidades foram desperdiçadas e porque atitudes não foram tomadas, ninguém
sabe o que poderia ter acontecido. Por que o amor tem dessas coisas?
Vezenquando, o amor vira quadrilha. E quando o amor vira quadrilha, a
solidão vira o compasso da dança.
Nicole
Furtado
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