segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

 




"Já não se encantarão os meus olhos nos teus olhos,
já não se adoçará junto a ti a minha dor.
Mas para onde vá levarei o teu olhar
e para onde caminhes levarás a minha dor.
Fui teu, foste minha. O que mais? Juntos fizemos
uma curva na rota por onde o amor passou.
Fui teu, foste minha. Tu serás daquele que te ame,
daquele que corte na tua chácara o que semeei eu.
Vou-me embora. Estou triste: mas sempre estou triste.
Venho dos teus braços. Não sei para onde vou.
... Do teu coração me diz adeus uma criança.
E eu lhe digo adeus."

(Pablo Neruda)





É curioso como num relacionamento as pessoas começam e terminam do mesmo jeito: como dois estranhos". Não sei quem é o autor da frase, mas fiquei pensando na dolorida verdade dessas palavras. 

Há exceções, eu sei, como em tudo nessa vida, mas a maioria dos nossos relacionamentos acabam mesmo retornando ao clássico abismo da estranheza. Eu e você agora seremos apenas dois estranhos que um dia se viram, se encantaram, se aproximaram, se amaram, trocaram carícias, salivas e segredos para depois tornarem-se pólos contrários, repelindo-se mutuamente.

Pensar sobre o amor e sua efemeridade deixa um gosto amargo de melancolia na boca, é encarar o terrível nada, a dor do vazio. Pode ser e muito provavelmente foi: o vivido talvez nem tenha sido amor. Tanto faz. Estranho mesmo é a intimidade temporária conquistada e perdida, o desnudar-se diante do outro (enganam-se os que pensam que nudez só tem a ver com roupas) e o deparar-se de repente com o olhar de um desconhecido que nada diz porque nada mais sente.

Corpos que um dia se entrelaçaram nus, se descobriram, se conheceram. Bocas que se tocaram, se provaram, sentindo o gosto da outra como se fosse o seu. Sorrisos, suspiros, toques, olhares, beijos, momentos. Tudo agora transformou-se em sombras, páginas rasgadas, lágrimas secas e esquecimento.

Eu e você somos o que não mais existe, ilusões inúteis do que um dia poderíamos ter sido. Nosso amor foi uma criança tola e imprudente, que errou, brincou demais, fez uma bagunça enorme em nossas vidas e confundiu tudo dentro da gente. E nós, adultos sem piedade, o castigamos severamente e, sensatos, nos desfizemos dele enquanto era tempo. 

E agora não nos resta mais nada além do que somos: dois estranhos condenados ao suplício de se verem, porém incapazes de se enxergarem. Seguimos cegos, mudos e loucos, erguendo a cabeça, fingindo que não era nem nunca foi e tentando colar os pedacinhos partidos do que um dia foi o nosso coração. 



TAÍS KRUGMANN









 **Texto e imagem retirados do blog  Amor no singular










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